terça-feira, 26 de maio de 2009

Os bichos também são gente...

Três autarcas de Paredes de Coura emitiram um pedido de socorro ao Governo para tentar solucionar o velho problema da destruição de culturas agrícolas por gado equino e bovino que anda à solta nos montes.

Em Bico, Vascões e, mais recentemente, Mozelos, a população vive em sobressalto porque não há horta ou pasto que resista às investidas dos animais semi-selvagens. "Temos sido martirizados. O gado bravo só não vem dormir connosco à cama", queixa-se António Raínho, 69 anos, morador no lugar de Lamas, freguesia de Vascões, uma zona onde existiu uma colónia agrícola e hoje não há ninguém que não tenha já sofrido prejuízos com a descida das 'burras' (nome que a população dá aos cavalos) e das vacas dos baldios para as povoações à procura de pasto.

"Porta por porta não há ninguém que não se queixe. Isto é uma bicharada que devora tudo", corrobora a mulher de António, Delfina Raínho, de 66 anos, lamentando: "Não nos têm deixado nada para o nosso rebanho. Temos tudo vedado a rede mas não adianta. Um dia destes eu e mais o meu marido fomos no tractor e quando chegámos ao nosso terreno, à beira da estrada, lá estavam dentro três bois enormes".

À porta dos Raínho vai-se juntando vizinhança, enquanto os donos da casa desfiam histórias sem parar. "Sou bombeiro e um dia destes vinha à noite para casa e contei 19 vacas na estrada. Não me atrevi a passar porque elas são bravas atiram os cornos ao carro e estragam tudo", conta o marido de Delfina, logo seguido por mais um testemunho da mulher: "Um vizinho nosso que foi ao monte procurar um bocadinho de mato para trazer para os estábulos, quando saiu do tractor, foi atacado por uma vaca e foi parar ao hospital. Nunca mais se soube mais nada, porque depois os donos do gado não se acusam, e pronto, mal do homenzinho que ficou empenado". "Aqui tem sido uma miséria. Carros inutilizados, pessoas aleijadas, tudo por causa desse gado maligno…", lastima.
Que o diga Maria de Sousa, que ao 75 anos exibe numa perna as marcas de um episódio vivido com animais bravios. "Uma vez foram-me às couves e eu fiquei aleijada porque fui atrás das 'burras' para as tirar do campo e caí", lembra a idosa, deixando transparecer nas palavras a sua revolta: "Até tinha coragem de lhe dar um tiro".


Histórias como estas ouvem-se por toda a região, principalmente, nas freguesias de Vascões e Bico, e, por causa disso, há mesmo quem defenda que a destruição de cultivos explica o aparecimento de animais mortos a tiro ou envenenados no concelho. Recorde-se que no ano passado foi encontrada na área da Paisagem Protegida de Corno de Bico uma dezena de garranos chacinada a tiro de zagalote e, mais recentemente, foram encontradas outras três cabeças de gado equino abatidas a tiro na freguesia de Mozelos. Até agora, as autoridade não acharam explicação para o sucedido, apesar de, pelo menos, no primeiro caso, as investigações se encontrarem sob a alçada da Polícia Judiciária.


Ana Peixoto Fernandes, "Gado bravo só não vem dormir na nossa cama", Jornal de Notícias, 26 de Maio de 2009, p. 18.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Uma roulotte transformada em mostruário de livros foi à Escola. Os bebés acotevelavam-se para ver. Uma colega de Português indicou-me este livro de Jeff Kinney. Li uma ou duas páginas, pareceu-me bom humor. Por uma vez um livro sem as pieguices dos livros de jovens. Na Amazon há um mar de críticas favoráveis. Uma leitora, que apenas dá uma estrela ao livro, escreve nesse site: "Diary of a Wimpy Kid" sets out to recount what real life is like for young boys, which it does in many ways, but misses every opportunity to present morality lessons for the reader. The day-to-day actions and thoughts of the main character are not presented as wrong or right, but as the-way-it-is, which does a disservice to young readers and parents searching for books that their kids will want to read. While adults may laugh out loud at some of the antics in this book, kids may be left with the impression that calling other kids "morons" is an appropriate attitude and reasonable form of expression. Bullying younger kids is presented as a "right-of-age" rather than an act to be discouraged. I suppose with TV and movies pushing the envelope of good manners, "children's literature" will naturally follow. This book does not appeal to the better angels in us, but appeals to the lowest common denominator. Anyone searching for books to enrapture their young boys should pick up the works of Mark Twain. Those stories appeal to the mischievous side of boys while clearly demonstrating right and wrong behavior. They also tackle social issues still relevant today." Esta crítica recebe o seguinte comentário: "This a book to read together then, yes? and discuss what it right and wrong. That is specifically why my child found it so amusing. He knew some of the stuff that kid did was "wrong" and "forbidden" at our house. Books and movies help escape to fantasy land. I guess it depends on the child and the maturity level. " Interessante.

sábado, 16 de maio de 2009

Declaração

A M. acabou o teste num ápice. Afastou o teste, como quem afasta o prato sujo à refeição para passar à sobremesa. Deitou-me um olhar, meio de desafio, meio de pedido. Pegou num caderno e recomeçou uma escrita a lápis. É um caderno A5, quadriculado, com argolas.
- Não são as suas memórias, suponho.
- Não - e a M. ri-se. A M. tem 15 anos.
Passado um bocado a L. levanta-se, apanha o caderno da M., e começa a ler. Acena com admiração. A B. depois pega no caderno e também lê. Ri-se e acena. A A. também é rapariga e por isso também é gente. Ela lê e também acena elogiosamente. São 3 páginas conta a A.
- Olha lá, tchavalo? - pergunta a A., baixinho, insistindo no t.
- Sim, eu digo tchavalo - responde a M. contente com a sua variante estilística.
A M. recupera o caderno e retoma a escrita.
- Mas são confidências?
- Não, é uma declaração de amor!
- Oh, que bonito!

terça-feira, 5 de maio de 2009

Comunicação

- Mas isso é grátis?...
- Sim, temos 1500 mensagens por dia.
- 1500 mensagens gratuitas?!
- A gente faz um carregamento, e podemos enviar essas mensagens por dia.
- Mas quanto é o carregamento?
- Duas em duas semanas, €5.
- Mas não gasta as 1500 mensagens diárias, imagino...
- Não mas um dia andei perto, 1450.
- Para o namorado?!
- E para outras pessoas, claro.
- E também envia mensagens à mãe?
- Não, ela não sabe ler mensagens.