terça-feira, 14 de outubro de 2008

Reprovações - sim ou não?

Argumentário do não
Numa carta dirigida ao Director do jornal Público inserta na edição de ontem, Santana-Maia Leonardo advoga o fim das reprovações: "(...) as reprovações, pela própria natureza da escolaridade obrigatória, são incompatíveis com um ensino de qualidade e um alto rendimento escolar". Como o nível de conhecimentos dos alunos é miserável, para que a taxa de reprovação não atinja um valor altíssimo, os professores acabam por dar mais notas positivas do que as merecidas. Quem chumba acaba por receber positiva um ou dois anos mais tarde "por antiguidade", embora não evolue nos seus conhecimentos. As notas não revelam os conhecimentos, são "aldrabadas". Pelo contrário, num sistema em que os alunos nunca chumbam, as notas podem reflectir com verdade o desempenho dos alunos. Para terminar a escolaridade obrigatória com nível 3 não bastaria ficar à espera das notas positivas por antiguidade. O Ministério poderia definir apoios a dar aos alunos que reincidissem nos níveis 1 e 2. Em países nórdicos - Suécia, Dinamarca e Finlândia - os alunos não reprovam no ensino obrigatório, independentemente do seu desempenho.

Argumentário do sim
O Jornal de Notícias trazia ontem os depoimentos de duas professoras que se aposentaram recentemente, antecipando o momento da reforma. A Professora Fátima Miranda queixa-se que desapareceu a "humanidade e a criatividade", sendo que a alma da escola morreu - os professores estão "assoberbados de trabalho técnico e burocrático". "Em termos de aula é uma indisciplina total, e quase ninguém fala disso". Os alunos "não respeitam a figura do professor e não têm motivação", sendo que "os professores são pressionados, de uma forma legal, para que os alunos passem e as crianças ficam completamente desmotivadas porque já sabem que vão passar". Para a colega Fátima Miranda, com 38 anos de serviço docente na disciplina de Português, a passagem de ano mais facilitada aumenta a desmotivação dos alunos.

Os depoimentos da Professora Manuela Medina, com 37 anos de serviço na disciplina de História, também apontam para a degradação da prática docente: "há uma indisciplina, uma má-criação e um desinteresse total. Os miudos não têm a noção do que podem dizer e fazer. Aqui, os pais têm muita, muita responsabilidade." A colega não relaciona o trabalho que é possível realizar com os alunos, com a facilidade/dificuldade dos alunos para transitar de ano.

Em que ficamos?...

sábado, 11 de outubro de 2008

Quadros superiores...

O Le Monde de ontem, no suplemento de livros, traz um pequeno artigo sobre Charles Lewinsky, a propósito do lançamento do seu livro Melnitz em França. O livro relata a vida de uma família judia na Suiça entre 1871 e o final da guerra em 1945. A um dado momento o jornalista observa que o autor, no contacto com os leitores nas sessões de promoção da obra, tem o aspecto de um quadro superior, o que contrasta com o seu dia-a-dia quando cuida das courgettes, abóboras e tomateiros na sua horta, em Vereux (Franche-Comté) onde habita. De repente pensei, será que nós, professores, temos ar de quadros superiores? A debandada dos professores relatada recentemente pelos jornais, na demanda de uma reforma longe da Escola, inspira uma resposta negativa. A burocracia asfixiante da "avaliação" também não ajuda.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Valerá a pena votar?...

O escândalo da atribuição de casas pela Câmara Municipal de Lisboa é mais um empurrão para afastar o cidadão comum da política e dos políticos. Nas eleições intercalares para a CML de 2007 votei em branco. Em breve deixarei de votar em branco e passarei a abster-me, creio bem. A arruaça de publicar a lista dos favorecidos ainda me deprime mais - é "viracasaquice" do mais alto grau: um dia indivíduos são presenteados com favores que o lisboeta comum desconhece e, no outro, são atirados aos leões esfomeados.

Mistura explosiva nos CEF

Os CEF são necessários mas explosivos.

Em primeiro lugar os alunos dos CEF são uns privilegiados porque os cursos funcionam com turmas de 14 ou 16 alunos, o que corresponde a cerca de metade da dimensão das turmas do ensino regular. Depois - no caso do Básico - é-lhes dada a possibilidade de terminar a sua educação obrigatória num âmbito profissionalizante, o que lhes permite uma integração mais fácil no mundo do trabalho. Os alunos dos CEF também têm apoios invulgares no ensino regular. Mas, na prática, os CEF funcionam em fio de navalha...

Alunos desmotivados - desmoralizados com as charadas do ensino regular - chegam tardiamente ao CEF do Básico; a carga horária é excessiva; jovens de 15 anos passam horas e horas sentados e apenas têm uma aula de 1h30 de Educação Física semanal. As disciplinas podem ser maçudas e no fundo são basicamente decalcadas de cadeiras universitárias...

O artigo de Pedro Picoito (docente do Instituto Superior de Educação e Ciências) no Público de 5ª feira, 25 de Serembro, p. 41, "Só uma escola exigente é democrática", põe a tónica na justiça social da exigência escolar. A Escola Pública apenas cumpre o seu desígnio de democratização do acesso ao saber e competência se for exigente, estimulando a excelência. Insucesso escolar combatido com exames mais fáceis minam a excelência. Só uma escola que "respeita o conhecimento [é que] respeita os alunos, respeita as famílias e respeita os contribuintes que a pagam."

A desmotivação dos "clientes" dos CEF, associada a um espírito de falta de exigência, pode tornar impossível o trabalho do professor.